Ela chegou triste naquele dia. Correu para o espelho e ficou ali, se olhando. Queria enxergar qualquer coisa diferente. Uma pinta no rosto, uma alça fora do lugar. Qualquer coisa. Ainda estava com o cabelo em ordem e o rosto maquiado. Só tinha o olhar raso. E de tanto se olhar quase transborda. Não sabia dizer o que sentia. Mas não voltara a mesma. Trazia da rua um monte de coisas que não levara de casa. Mas não podia guardar ali. Em compensação, não podia deixar na calçada. Era muito pesado, e não podia deixar ao relento um sentimento doído. Podia chover, podia passar qualquer cachorro e arrastá-lo...Em frente ao espelho encarou-se novamente. Era tão triste aquele olhar. Tão raso que nem as mágoas afogariam. Ela jogou o cabelo. E, sem piscar, levantou o olhar. Respirou. Em ponta de pés, abriu a porta, e deixou lá. Na calçada. 'Nem estava tão frio assim' (pensou). Depois voltou e correu para o seu diário. É que tristeza, solidão, decepção...tudo isso é bem produtivo também, e nem sempre é tão pesado de carregar quando está escrito.
Ivanúcia Lopes
Ivanúcia Lopes
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