sexta-feira, 4 de setembro de 2009

Crônica de uma parceria feliz

Não conheço Marcelino Vieira. Incursionei pelas plagas norte-riograndenses, ou potiguares, em dois momentos apenas. Um primeiro e, devo dizer, reiteradamente, a Natal, a capital. Cortesias de litorâneos. Doutra vez ao sertão (ou Seridó? Esclareçam-me, por favor!), numa caravana etílico-religiosa a Carnaúba dos Dantas, acompanhando a minha mãe. Ela cumpriu o lado religioso; eu e minha irmã, Gracinha, o lado profano da romaria.

Mas, por uma dessas ironias do destino, a pequena cidade se fez presente em minha vida. Sem me conhecer (e a recíproca é verdadeira), nem presencialmente nem nos limbos do conhecimento, não sabíamos da existência um da outra, ela proporcionou um momento feliz, desses a serem escritos nos anais de minha nômade vida.

Simplesmente, enviou-me uma jóia. Uma pérola dessas geradas no ventre da providência. Providência no sentido mais puro. Nessas que os fundamentalistas de plantão não hão de dar crédito. Nessas onde a disponibilidade desinibida para a vida se faz, onde o brilho próprio e o esbanjar da luz encontram seu lar, seu leito. Nessas onde a felicidade de viver dia após dia, um de cada vez torna-se meta. Nessas em que o sentir vida ao enredor, por sua perspicácia, a tenacidade e a sensibilidade, nos surpreendem sempre. Nessas onde o sentir o ardor e a delicia do caminhar, nos encanta. Nessas onde a naturalidade do fazer e, aí me ganhou, da humildade são provas incontestáveis de uma humanidade além dos limites de nossa época. E, afora isso, uma competência inquestionável.

A natureza das coisas, a alma do mundo (no dizer de Espinosa) proporcionou-me um encontro feliz. A providência, mais uma vez ela, generosamente, deu-me a honra e a alegria de ser professor e partner no trabalho de conclusão de curso de mais uma jornalista. E aí devo ressaltar: não mais uma. Simplesmente uma menina de sorriso franco, fácil (por vezes meio acanhado, tímido), uma firmeza inquebrantável de princípios e, acredito, uma condição de tornar-se marca indelével na vida de quem conhece, de quem partilha de seus sonhos e realizações. Ademais, uma fé intrínseca, natural. Não quero que ela se perceba assim. Meu desejo é que é que ela mantenha-se em sua naturalidade. A espontaneidade é seu charme particular, a sua força.

Mas, falávamos de encontros e de providência. Uma natureza atlântica, desterrada, encontra uma personalidade agreste, destemida, em território neutro. Desterramento mútuo. E, nesse encontro, nada pintou-se árido, improdutivo, da falta de horizontes, nem molhado pelas ondas da inércia, da preguiça, do descompromisso. Pintou-se, isso sim, de força e criação, percepção, cumplicidade, anima de vida. De um momento em que sentimos orgulho em assumir essa porção híbrida de jornalista-professor (ou jornalista em sala-de-aula, como prefiro) e de aprendiz (ora, aprendiz!) de jornalismo.

Não me orgulha o fato de ser o “professor” universitário, simplesmente, de um curso de comunicação social, com habitação em jornalismo. Sou possuído pela força do educador. Orgulha-me a força do encontro com pessoas ávidas o aprender e a possibilidade do aprender, do pensar, da percepção de que o “outro”, aluno ou aprendiz, quer aprender e lhe escolhe, não aleatoriamente, para dividir conhecimentos, partilhar, construí-lo. Ela proporcionou-me isso, sem reservas, sem engodos.

Acredito no divino inerente a pessoas, coisas, objetos, produções humanas. Nem uma pessoa chega a nossa vida por acaso, nem um bicho, planta ou livro também. O imã que nos aproxima tem uma signagem, um sentido, uma direção, uma lição, uma mensagem intrínseca, seja para o bem ou para o mal. Forças que atraem ou geram repulsa são naturais. Essa é a dicotomia da vida. Dialética antes de polarismos.

Acredito, sobretudo, na força singular dos encontros. E no produto que pode sair desses encontros aleatórios. Casuais? Uma relação eterna, uma compreensão mútua para além dos limites, uma prosaica monografia... Acredito nessas forças que geram o abraço fraternal dos nômades. Simples assim. Simplesmente improbabilidades prováveis, táteis, factíveis. Acredito nas pessoas e no poder de realização delas e, quero crer, ingenuamente, que contribuo com meu espírito nômade e construtor, em limitadas aulas de um jornalista/cronista de Comunicação Rural, que mais tem de humanidade, para isso.

Obrigado, Marcelino Vieira,
A benção, Maria Ivanúcia Lopes da Costa.

by Edson de França



(Crônica feita pelo professor Orientador de minha monografia do Curso de Jornalismo. Achei o máximo! Orgulho...)

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