Repentinamente.
Delicadamente.
Silenciosamente.
Foi assim que a morte deu vida a essa dor. Foi assim que a vida de minha mãe abreviou-se a despedida.
Só foram sete dias. Uma eternidade abreviada de aprendizado sem ti. De tempo que não mais usamos para partilhar ao seu lado. De tempo que não tivemos a chance de te abraçar, te beijar, acariciar seus cabelos, de correr ao teu colo e se fazer menina para roubar-lhe um, dói, ou três beijos. Agora não te temos mais aqui, em nosso meio.
E isso dói. Dói porque não aprendemos a viver sem ti. Não aprendemos a chorar sem seu consolo. Não aprendemos a andar sem que você no indicasse a direção. Não aprendemos a sorrir sem partilhar nosso riso frouxo. E não sabemos ainda, mainha, como será tudo isso.
Não sei como vai ser sentir suas lembranças nos cantos e recantos. Mas vai ser dolorido.
Não sei como dar conta dessa vida que não é só nossa, mas um tanto sua. Agora eu já não sei como chorar nem como sorrir. E não porque não tenhas nos ensinado, mas porque a sua fortaleza nos encorajava. Nos edificava e nos fazia melhores.
O meu melhor sem ti, se torna medíocre.
A minha força sem ti, agora é pequenina.
Meu olhar sem ti, agora é sem brilho, sem graça...
Porque minha mãe, rio de fortaleza, soube fluir bem na família e na comunidade. Soube alagar os passos pra driblar as dificuldades, soube renunciar para garantir nossa felicidade, soube ser humilde em todo sempre.
Sim. Minha mãe fora grande.
Fora fiel nas grandes e nas pequenas coisas.
Fora esposa companheira.
Filha exemplar.
Amiga incondicional.
Ser humano especial.
Cristã renovada.
Soubera ser mãe como quem não sabe ser outra coisa tão divinamente. Amou mais do que pôde, que extravasou quaisquer limites, se e que eles existem.
E é por isso. Que neste dia. Parece não haver palavras dignas para tanto.
Foi um tanto rápido. Surpreendente. E eu que nunca pensei em viver sem ti, continuo sem pensar. Porque , na verdade, não quero ficar longe de ti mainha, acho que a vida ficaria mais dura do que ela é. É duro ter que aceitar, ter que despedir, ter que chorar e não te ver por aqui.
E esse aperto aqui dentro? Sem minha mãe pra acalmar?
E essa vontade de desistir, sem minha mãe pra me incetivar?
E esse lamento?
E essa loucura de querer chegar e te ver de longe na porta de casa, como um tímido sorriso e um abraço escancarado pra dizer que chegando em casa nada de ruim me atingiria. Que chegando em casa nos seus braços estaria segura. Que chegando em casa os sonhos eram possíveis, a dor tranqüila e a vida mais feliz...
E nossos sonhos? E nossos planos? E nosso dia a dia? Como será?
Não. Eu não queria sentir essa dor de jeito nenhum. Mas talvez, por estarmos acostumados como você, ela se torne mais doída ainda, porque não nos acostumamos a chorar sem ter você do nosso lado para aparar nossas lágrimas.
Não tivemos tempo bastante para chorar o medo de sentir essa dor. E mesmo se tivéssemos tido, não seria suficiente. Mas se posso nesse momento recordar, resumidamente o tempo que vivestes conosco, recordo da mãe que arrumava suas duas filhas com vestidos iguais pra ir pro colégio. Da mãe que, ao lado do pai, sacrificou-se pra dar do bom e do melhor. Da mãe que nunca se ausentou. Que na pré-escola ou mesmo no ensino médio, adorava reuniões de pais e mestres.
Da mãe que pegou em nossas mãos pra nos levar pra escola, pra missa, pro sítio de meus avós, pra todo canto... da mãe que ao lado do pai, renunciou seus caprichos, se é que os tinha, pra não deixar que nada faltasse, pra dizer que estava ali, pra dizer que podia contar sempre.
Não. Eu não quero acreditar quando o poeta diz que o sempre, sempre acaba. Acreditar nisso agora é a coisa mais dura que eu poderia experimentar. E isso me dói.
Recordo ainda da mãe que, ao lado do pai, juntava trocados suados pra comprar uma roupa melhor pro Natal, pra festa de junho, pro material escolar...pro sorvete.
Lembro de mainha, que, levantara-se varias vezes na noite, ate um dia desses pra ver o sono de suas filhas. Pra ver a quietude do sono de uma menina, que mesmo aos vinte e poucos anos, acordara chorando, algumas vezes. Da mãe que não dormia antes que a sua filha distante te ligasse pra pedir a benção.
Lembro da mãe que sentava conosco pra jogar conversa fora. Da mãe amiga, que falava trabalho, de festas, de namoro...da mãe que na maioria das vezes, se tornava, tal como nós, a melhor amiga de minhas amigas.
Lembro da mãe que não tinha outros sonhos, senão, os nossos.
Lembro de mãe apaixonada. Do zelo interminável. Da paixão sempre viva. Do amor que dedicava ao casamento. Das renuncias. Das juras de amor...e dos beijos encabulados que eu via...mas achava tão bonito.
E agora, já não seria preciso dizer mais nada, a não ser do amor que temos, e da fé, que embora fraca, nos ajudará a entender tudo isso.
Lembro da mãe que, ao lado do pai, fez de todo um coração pra dizer que não havia dificuldade que não pudesse ser vencida. Da mãe que me incentivou a ser quem sou. A querer ser quem sou. E a gostar de ser quem sou.
E agora, eu só queria ter lido pra ti esse texto antes que eu tivesse lido ora todo mundo. Como eu fazia com minha matérias, minhas mensagens, minhas poesias... como eu fazia com essas coisas minhas, que também eram suas. Porque não sei se haverá nessa vida alguém que me incentive tanto como ela fez, alguém que cuide tanto de mim como ela fez, alguém que queira tanto o nosso bem, como ela sempre quis. Não. Não haverá. Mas se não nos tornarmos seres humanos melhores a cada dia, renegaremos tanto ensinamento que ela nos passou...
Faça-nos sentir o seu amor ainda entre nós, para que seja menos doída a nossa vida. E por painho quero que olhes, como sempre, quero que zeles como sempre, que esteja ao lado dele como sempre...e que o amor seja imortal...como nos ensinara.
A gente chora agora. Talvez amanhã também...e depois...e depois...Mas queremos contar com sua lembrança sempre, para que não nos sintamos sozinhos.
Sim, esta doendo. E essa dor é tão grande que já não tenho palavras pra expressar. Obrigada por tudo mainha e por amar nossas qualidades e defeitos, e por nunca desistir de nos fazer pessoas melhores.
Perdão mainha pelo silêncio que ainda restou. Pelo excesso que deixei escapar. Pelos erros que embora corrigidos por ti, cometi-os outras vezes. Pela imperfeição de nossos atos...pela demora em reconhecer sua razão...
Obrigada por tudo. Muito obrigada. Os ensinamentos serão pra sempre...
É verdade que nunca parei pra imaginar como seria a vida sem ti. E noto que minha opinião, foi por todo sempre, tal como a do poeta, quando diz que a mães não deveriam morrer...
Pode ser que depois a gente entenda, mas agora o que a gente mais queria era te ter de novo em nosso meio. Sentar do seu lado. Pegar na sua mão. Dar-te mil beijos, pentear-lhe os cabelos. Rir com a senhora...chorar com a senhora...fazer tudo na certeza de que estarias na porta de casa, abrindo a porta, ou então na ponta da calçada vindo ao nosso encontro...
Eu sei mãe. E vejo que a cada dia vai ser mais difícil sem ti.
E de onde a senhora estiver, antes que nos aplauda como fazias para nos incentivar, fiquemos todos de pé, para aplaudi-la.
E fique com Deus minha mãe, que tua família, teus amigos, e todos aqueles que te admiravam ou ouviram falar de ti, ficarão aqui, rezando pela senhora. As lembranças estão vivas. E nunca vão morrer.
Te amamos.